Nota prévia indispensável: o signatário foi interveniente no processo político de criação dos julgados de paz.
Na lei que os criou em 2001 ficou estabelecido que:
a) A sua actuação é vocacionada para permitir a participação cívica dos interessados e para estimular a justa composição dos litígios por acordo das partes;
b) Os respectivos procedimentos estão concebidos e são orientados por princípios de simplicidade, adequação, informalidade, oralidade e absoluta economia processual;
c) Neles é adoptado o uso de meios informáticos no tratamento e execução de quaisquer actos;
d) Cada julgado de paz tem um serviço de atendimento;
e) Há neles um serviço de mediação, que oferece aos interessados este meio de resolução alternativa de litígios;
f) A mediação é uma modalidade extrajudicial de resolução de diferendos, de carácter privado, informal, confidencial, voluntário e de natureza não contenciosa, em que as partes, com a sua participação activa e directa, são auxiliadas por um mediador a encontrar, por si próprias, uma solução negociada e amigável para o conflito que as opõe;
g) O mediador é um terceiro neutro, independente e imparcial, desprovido de poderes de imposição de uma decisão vinculativa;
h) Compete ao juiz de paz proferir, de acordo com a lei ou a equidade, as decisões relativas a questões que sejam submetidas aos julgados de paz, devendo, previamente, procurar conciliar as partes.
A referida lei foi aprovada na AR, por unanimidade, tendo tido origem numa iniciativa da oposição - PCP - que todos os grupos parlamentares e o Governo de então se empenharam em transformar num processo político exemplarmente partilhado e construtivo.
Em cinco anos de existência, na escassa dúzia de julgados de paz instalados e num conjunto de casos tratados que se aproxima das duas dezenas de milhares, a mediação permitiu resolver, no espaço de sema- nas, 30% dos conflitos e a conciliação feita depois, com especial seriedade, pelos juízes de paz teve êxito em 40% dos restantes. Isto é, por contraste com o sistema de justiça tradicional, virado para a lógica da tensão adversarial, bem mais de metade das questões levadas aos julgados de paz foi resolvida por acordo das pessoas envolvidas, que aproveitaram, esclarecidamente, o contexto diferente que aí se lhes proporcionou, preferindo o diálogo à discussão. São pois erradas as preconceituosas ideias de que há nos portugueses uma irremovível cultura de litigação e de que estes não são capazes de resolver os seus diferendos sem a intervenção de um terceiro com o poder de lhes impor uma decisão.
E fica demonstrado que é mesmo possível construir uma justiça diferente, pensada para servir, acolher e ajudar as pessoas a superar os seus problemas, sem formalidades inúteis, com grande rapidez e enorme economia de custos.
Diogo Lacerda Machado
Barrocas Sarmento Neves, sociedade de advogados
In DN On-Line (Economia)
02 fevereiro 2007
Subscrever:
Mensagens (Atom)