A mediação penal está prestes a chegar a Portugal com o avanço de um projecto experimental, cuja legislação está a ser preparada pelo Governo. O objectivo é resolver crimes sem o recurso ao tribunal, por via de um acordo entre as partes. No Porto, funciona já um projecto-piloto, cujos resultados têm sido positivos.
A Escola de Criminologia da Faculdade de Direito do Porto iniciou a mediação penal em Portugal em 2004, através de um protocolo com o Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) do Porto. Os primeiros casos chegaram em 2005 e, à semelhança do que está previsto no anteprojecto de lei, só crimes puníveis até cinco anos de prisão podem ser resolvidos.
"Os casos com menores de 16 anos e de violência doméstica foram excluídos", explicou ao DN Josefina Castro, directora adjunta da Escola de Criminologia e uma três pessoas que fazem mediação. "A violência doméstica ficou de fora porque há uma desigualdade grande entre arguido e vítima. A mediação pressupõe duas partes iguais", justificou.
Josefina Castro adiantou que a mediação, enquanto forma de justiça restaurativa, tem "como centro a vítima e o que é possível fazer para reparar o dano, ao contrário da justiça convencional em que a vítima é apenas uma testemunha". Mas é preciso cuidado na abordagem. "É identificada com a ideia de perdão e, por vezes, as pessoas ficam de pé atrás. Não é esse o objectivo."
No total de 24 processos recebidos, a maioria tem como base crimes semipúblicos, como ofensas à integridade física, dano, ameaças ou injúrias. Normalmente, envolvem casos de vizinhança. "Em quase todos, as pessoas já se conheciam antes", explicou a mediadora.
O processo começa com um contacto prévio do DIAP a anunciar às pessoas que o caso vai para mediação. As pessoas têm de consentir, depois há sessões prévias com cada uma das partes. Depois juntam-se face a face e procuram, com ajuda do mediador, chegar a um acordo. Caso falhe, o processo regressa ao DIAP e nada se diz sobre porque falhou. Com acordo, resolve-se com a desistência de queixa.
O acordo implica, por regra, um pedido de desculpas. Para já, em 24 casos, foram conseguidos 12 acordos. Josefina Castro destaca que as pessoas acabam por captar bem os pressupostos da mediação: "Até conseguem perceber as razões da outra parte."
Um dos casos exemplificativo do que pode falhar envolveu uma situação de danos materiais num veículo e ofensas à integridade física: "Era uma história longa de conflito. Houve cedências até certo ponto e até foram aceites as desculpas. Parecia tudo resolvido. Mas não foi assim. O montante da indemnização gerou discórdia e levou uma das partes a preferir ir para tribunal."
David Mandim
Diário de Notícias 28 de Agosto 2006
29 agosto 2006
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