28 outubro 2007

"A escola deve ter uma atitude preventiva"

O país tem a ideia como generalizada e factual a indisciplina e a violência escolar estão a aumentar. O Governo apresentou uma revisão do Estatuto do Aluno para travar essa "incivilidade sentida nas escolas", que o Parlamento terminará de aprovar na próxima semana, na especialidade. O JN procurou os números dessa realidade e constatou que não existem dados oficiais.

João Sebastião, coordenador do Observatório de Segurança Escolar, tutelado pelo Ministério da Educação, garantiu ao JN desconhecer estudos ou alguma entidade que possua esses dados. Restam apenas os números da linha SOS Professor a funcionar desde Setembro de 2006, a linha recebeu 184 queixas durante o anterior ano lectivo. Uma média superior a uma por dia (no ano lectivo 2006/07 houve 162 dias de aulas).

Consciente e preocupado com essa situação, o procurador-geral da República vai emitir uma directiva para o Ministério Público fazer essa recolha, "começando pela participação de todos os ilícitos que ocorram nas escolas", garantiu, ao JN, fonte oficial da procuradoria.

"A sensação de impunidade tem de acabar. Um miúdo de 15 ou 16 anos que exerce violência sobre o colega ou professor e que a directora, porque tem medo, não participa às autoridades é uma situação tremenda", defendeu Pinto Monteiro, há uma semana, numa entrevista ao semanário "Sol".

Na "exposição de motivos" da proposta do Governo, a tutela defende que a "indisciplina se configura como um obstáculo à afirmação da escola". E o abandono e insucesso escolar é um dos problemas estruturais do país para o qual o presidente da República pediu melhorias. No último relatório divulgado pela OCDE, em Setembro, apenas 26% dos portugueses entre os 25 e 64 anos têm o secundário. A média da OCDE é de 68%. Pior que nós só o México (21%).

O diploma propõe a distinção entre sanções correctivas e sancionatórias, agiliza os processos disciplinares e reforça a responsabilização dos pais correspondendo aos desejos expressos pelos docentes. O PS acrescentou-lhe, no entanto, um novo regime de faltas e uma prova de recuperação para os alunos faltosos, merecendo contestação imediata. Ontem mesmo, o líder do CDS anunciou que pedirá um debate de urgência com a ministra, logo após a discussão do Orçamento.

O JN também ouviu professores, pais e pedagogos. Todos concordam com o princípio da escola inclusiva, desde que vivido com regras e sem facilitismos. Mudar o texto da lei não chega, alertam. As escolas precisam de mais recursos. Os professores de formação em mediação de conflitos e os alunos de acompanhamento especializado e individualizado. Só assim, garantem, a indisciplina e violência poderão ser combatidas e os alunos conquistados.

Na escola moderna não habitam apenas alunos, professores e funcionários. A Associação Nacional de Professores - uma das 36 entidades que enviou para o Parlamento um parecer sobre a revisão do estatuto - defende a criação de comissões de convivência nas escolas. Equipas multidisciplinares, com técnicos sociais de educação, docentes, psicólogos e mediadores de conflitos que interviriam não só junto do aluno mas também das famílias.

O diploma, considera João Grancho, presidente da ANP e responsável pela Linha SOS, é excessivamente direccionado para "situações limite e não para a prevenção". "Se um aluno problemático for identificado no primeiro ciclo e desde logo devidamente acompanhado" deixarão de existir, ou quase, "as situações de violência continuada" até ao secundário, defende.

Alexandra Inácio, José Carmo
JN ON-Line

25 outubro 2007

Concelho de Leiria já tem mediação familiar

Um concelho em "desenvolvimento" tem de olhar pelas suas famílias. E foi "a pensar no bem da comunidade" - como sublinhou a presidente da Câmara -, que Leiria passou a dispor desde ontem de um espaço para a Resolução Alternativa de Litígios. "A autarquia não se pode alhear destes problemas sociais", justificou Isabel Damasceno.

Com a assinatura do protocolo de cooperação, o município leiriense passou a ser o primeiro de 15 em Portugal continental que aderiu ao Sistema de Mediação Familiar, até agora apenas disponível em algumas comarcas da Área Metropolitana de Lisboa.

Filipe Lobo, director do Gabinete para a Resolução Alternativa de Litígios do Ministério da Justiça, explica que este acordo de cooperação com a Câmara, permite ao concelho "integrar um mapa de mediadores", 68 existentes no país, e acreditados pelo Ministério da Justiça. A ideia, frisou, é que o mediador seja chamado a resolver assuntos de mediação familiar, como sejam os divórcios, a regulação do poder paternal e a pensão de alimentos dos menores, entre outros. "São problemas que podem ser resolvidos em Leiria, num espaço em alternativa ao Tribunal", explicou , sublinhando que a mediação familiar terá a duração de três meses. Caso o problema não seja resolvido nesse período, o assunto passará para a alçada dos tribunais.

"É uma nova alternativa para as pessoas que podem resolver os seus conflitos de uma forma mais simples e célere", concluiu.

De acordo com o protocolo cabe à Câmara disponibilizar e manter um espaço para a realização da mediação familiar. O local escolhido foi o da Divisão de Acção Social, que funciona no edifício Maringá, em Leiria. Os interessados podem ainda contactar o serviço, diariamente, através do número 808262000, e pedir a presença de um mediador.

O acordo de cooperação entre a autarquia e o Ministério da Justiça tem a duração de dois anos, sendo automática e sucessivamente renovado.

AS
JN On-Line

11 outubro 2007

Recurso a tribunais pode ser penalizado

A carga que todos os anos se abate sobre os tribunais judiciais é pesada - 800 a 900 mil novos processos - e é preciso "distribui-la criteriosamente". Evitar que a balança penda sempre para o tribunal é o objectivo da segunda fase do plano de descongestionamento, que hoje é aprovada em Conselho de Ministros. São dez novas medidas, a concretizar faseadamente até final de 2008, que apostam no alargamento dos meios alternativos de resolução de conflitos e introduzem penalizações para quem inviabilizar o recurso a essa solução.

O Ministério da Justiça não arrisca metas quantitativas, mas insiste no "efeito cumulativo" com o primeiro pacote de medidas que, em 2006, permitiu uma ligeira redução da pendência 0,4%, equivalente a 6.675 processos. "O ponto essencial é que não são medidas avulsas, mas a continuação de um esforço de descongestionamento que se iniciou em 2005", salientou ao JN o ministro da tutela, Alberto Costa.

A resolução que hoje é aprovada define as medidas e o respectivo calendário, mas muitas ficam ainda sujeitas a legislação posterior. Só uma é imediata e está já aprovada desde a semana passada, aguardando promulgação e publicação a criação de um regime temporário, aplicável até 31 de Dezembro, que dispense de pagamento de custas quem chegar a acordo ou aceitar o compromisso arbitral (ver mais pormenores na página ao lado).

No sentido inverso, até 23 de Janeiro estará introduzida uma alteração do regime das custas que penaliza quem inviabilize a resolução alternativa de conflitos mesmo que ganhe a acção, fica obrigado a pagar as custas. Terá de ser definida por portaria a abrangência da medida, em termos de universo de litígios.

Até final do ano deverá ser aprovada legislação que viabilize a criação de centros de arbitragem com competência em matéria de acção executiva. Uma "grande inovação", sustenta Alberto Costa, que permitirá que uma "quantidade significativa" de acções executivas passe a ser decidida fora dos tribunais. Também no capítulo da arbitragem, promete-se a criação de um centro para matérias de propriedade industrial.

Mais mediação

Março do próximo ano é a meta fixada para a criação de pelo menos mais oito julgados de paz. Mais demorado será o alargamento dos sistemas de Mediação Familiar e de Mediação Laboral a todo o território, sendo a concretização destas duas medidas projectada para final do próximo ano.

Os investimentos necessários não são, assegura o Ministério da Justiça sem apontar números, significativos. Os sistemas de mediação "são praticamente auto-financiados", enquanto os julgados de paz têm "uma forte comparticipação das autarquias". Alberto Costa acentua que, em contrapartida, o tribunal é o meio "mais solene e oneroso, que utiliza recursos escassos como são os juízes".

Sem vedar a possibilidade de se passar a esse patamar sempre que necessário, o Governo quer é evitar que essa seja a porta inicial para a resolução de conflitos. Até porque meios alternativos são, em muitos casos, a solução mais eficaz, justifica o secretário de Estado da Justiça, João Tiago Silveira, dando como exemplo problemas de condomínios "Em média, são resolvidos em dois meses nos julgados de paz".

O conceito de desjudicialização vai ser aplicado ao processo mais longo em tribunais judiciais o inventário. Por ano entram 7000 a 7700 processos (a maioria decorrente de heranças), que duram em média 32 meses. O seu tratamento poderá ser feito por cartórios notariais ou conservatórias, "ficando salvaguardado o acesso aos tribunais em caso de conflito".


Primeira redução de pendências na década

A entrada de processos nos tribunais mantém-se estável há uma década, no intervalo entre os 800 e os 900 mil. O problema está no crescimento da pendência, que até ao ano passado aumentava ao ritmo de 100 a 120 mil processos por ano. Restaurar a capacidade de resposta é, por isso, uma urgência que os planos de acção para o descongestionamento visam ajudar a conseguir.

Os números do Governo revelam que, em 2006, as 12 medidas concretizadas conseguiram, pela primeira vez em dez anos, estancar o crescimento das pendências e até conseguir a sua redução. Por duas vias entram menos 4,4% e findaram mais 14,3% de processos que no ano anterior.

A mais polémica medida foi a alteração do regime jurídico das férias judiciais, cujos ganhos têm avaliações diversas pelo Governo e pelos sindicatos do sector. Despenalização do crime de cheque sem provisão até 150 euros (elevando o valor anteriormente fixado em 62,35), elevação dos montantes para consideração de dívidas como incobráveis e incentivos à extinção de processos executivos em matéria de custas foram outras acções implantadas. Em matéria de incentivos, foram ainda aprovados benefícios excepcionais e transitórios (apenas aplicáveis em 2006) para a desistência de acções judiciais.

JN On-Line
Inês Cardoso

10 outubro 2007

Portugal aposta no uso da mediação no Direito Penal

Portugal está apostando em mecanismos da Justiça Restaurativa para tentar resolver conflitos criminais. Até o final do ano, entra em vigor a Lei de Mediação Penal. Os réus sujeitos a penas de até cinco anos de prisão terão a possibilidade de fazer um acordo e fugir das sanções penais. Mas só nos casos em que a vítima aceita conversar.

A Justiça Restaurativa preocupa-se, essencialmente, com a reparação dos danos sofridos pela vítima e propõe uma forma de reação ao crime diferente da Justiça Penal. Para seus idealizadores, prender não é solução. Eles sustentam que o Direito Penal não melhora a situação da vítima, do criminoso e da sociedade. Como educar alguém para viver em liberdade, tirando a sua liberdade? Essa é grande questão levantada pelos defensores mais radicais dessa nova forma de Justiça.

A Lei de Mediação Penal, em terras lusitanas, vai funcionar da seguinte forma: o Ministério Público recebe a ação penal e analisa a gravidade do crime para descobrir se há possibilidade de um acordo. Entra em contato com a vítima e o autor do crime para propor uma tentativa de acordo.

As partes são entrevistadas. Separadamente. A vítima diz o que sentiu e o que pode ser feito para que o dano seja reparado. O réu conta o que o motivou a cometer o crime e o que está disposto a fazer para contornar a situação. Vítima e infrator se encontram e, com a ajuda de um mediador, tentam um acordo. Se nada der certo, o caso vai para o Judiciário.

A professora da Universidade de Coimbra Cláudia Santos foi quem falou sobre o processo de implementação de práticas da Justiça Restaurativa na Justiça Penal portuguesa. Ela participou, nesta segunda-feira (8/11), do 13º Seminário Internacional de Ciências Criminais, promovido pelo Ibccrim (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais).

Menos e mais

Ao contrário do que pensa o grupo que defende o fim do Direito Penal e da prisão, a professora diz que a Justiça Restaurativa e a Penal se complementam. Para Cláudia, só as práticas alternativas não conseguiriam se manter, uma vez que para a resolução dos conflitos através de acordos em mediação é preciso que as partes estejam interessadas nisso. Nos crimes mais graves essa solução não se aplica.

A vantagem dessa Justiça alternativa é que a vítima ou os seus familiares têm espaço para dizer o que gostariam para amenizar o dano sofrido. Na Penal, isso não é possível. O juiz é quem vai decidir. Ao mesmo tempo, Cláudia vê o perigo das pessoas vislumbrarem apenas a indenização pecuniária como forma de reparar o sofrimento. “Se for assim, a Justiça Restaurativa só vai servir para os ricos. Os pobres, continuarão sofrendo processos judiciais”, alerta.

Cláudia é adepta do grupo que luta pela Justiça Penal Mínima: prisão só para casos em que o réu oferece perigo para a sociedade. O objetivo é punir menos com mais eficácia. Ela trouxe à tona, durante a discussão, a mais recorrente idéia de que o Estado precisa investir em uma prisão que faça com que a pessoa saia melhor de lá. O que não parece fácil, mesmo em países mais civilizados como os europeus.

A sociedade está cada vez mais violenta, mesmo com o alto índice de prisões, constata. Para a professora, esse é um dado que mostra como a detenção não resolve o problema. E critica o legislador que, de forma demagoga, aumenta o rigor das penas como se essa fosse a solução. “Como em nossos países não há prisão perpétua ou pena de morte, a pessoa vai volta para a sociedade. Vai chegar um momento que a população vai perceber que esse tipo de medida não funciona”, diz.

Até que a Lei de Mediação Penal entre em vigor em Portugal, o governo está formando mediadores e desenvolvendo projetos-piloto em algumas comarcas do país. Cláudia Santos é presidente da Comissão de Fiscalização dos Mediadores de Conflitos de Portugal.

por Lilian Matsuura
Revista Consultor Jurídico

08 outubro 2007

O Estado deveria «privatizar» a Justiça!

O Estado deveria «privatizar» a Justiça, apostando mais nos meios alternativos de resolução de conflitos.

A opinião é defendida pelo presidente da Consulmed (Associação Nacional de Resolução de Conflitos), Carlos Cardoso, em declarações à «Agência Financeira», ao considerar que «o que é desejável é que as pequenas divergências sejam resolvidas fora dos meios judiciários, nomeadamente através da mediação, uma vez que, a máquina da justiça é actualmente muito pesada».

Poupar tempo e dinheiro são, apontadas pelo advogado, como as principais vantagens da mediação de conflitos. Segundo o dirigente da associação, os processos através destes meios alternativos, demoram uma média de dois meses «mas há casos que se resolvem em 15 dias, ao contrário do tribunal, em que a maioria destes arrasta-se por dois anos».

Já os preços variam entre os 35 e os 70 euros, enquanto no sistema judicial, o valor mínimo anda à volta dos 200 euros.

No entanto, Carlos Cardoso considera que deveria haver uma maior aposta do Estado na divulgação destas alternativas. «Quando se pensa em mediação pensa-se em mediação imobiliária ou em mediação de seguros. Mas quando as pessoas se aperceberem que existe alguém no seu bairro que resolve os seus conflitos vão concluir que a justiça está muito mais à mão, de uma forma muito mais célere e muito mais barata», acrescenta.

Estado deveria financiar

Seguir o exemplo da Suiça que, conta actualmente com lojas de mediação nas ruas da capital, é apontado pelo presidente da Consulmed, como um dos exemplos possíveis de seguir. «São associações completamente privadas e financiadas pelo próprio Estado suíço, mas se falarmos em Portugal de um privado a ser financiado pelo Estado parece que estamos a falar de um crime», alerta.

Carlos Cardoso considera que «abrir mão do poder judicial é sempre complicado», afirmando, no entanto, que «se copiamos o modelo dos julgados de paz também podemos copiar outros modelos. O Estado tem de perceber que não pode fazer tudo, tem de dar iniciativa aos privados».

O presidente da Consulmed reconhece, porém, que tem havido alguma resistência por parte do Governo em «privatizar» esta área, apesar de ser «uma prática que, mais tarde ou mais cedo, vai ter de acontecer», cabendo depois ao Estado um papel regulador.

«Alargar os tribunais não é solução, porque há cada vez mais conflitos numa sociedade global. Resolve-se é com alternativas. E os meios alternativos estão aqui, o Estado tem de apostar e apoiar este género de associações», adianta Carlos Cardoso, acrescentando ainda que estes apoios não deverão ser exclusivamente financeiros.

«Estes serviços podem ser pagos pelo cidadão. Considero que o Estado, nesta fase inicial, poderá patrocinar estas associações para poderem funcionar», conclui.

Recorde-se que neste momento estão disponíveis três alternativas de resolução de conflitos, sem ser pela via judicial: arbitragem, conciliação e mediação

In: Agência Financeira On-Line