31 outubro 2006

Mediação de conflitos

"Numa época em que o intercâmbio entre as pessoas e nações e o manejo das diferenças estão na ordem do dia, as atenções voltam-se para o método do diálogo por excelência, a saber, a mediação.

A mediação vem se configurando como uma das formas mais exitosas de condução de conflitos. Apesar de ser uma prática muito antiga, documentada por antropólogos como presente em todas as culturas e religiões, só muito recentemente surgiu como alternativa válida entre nós.

Pode-se definir a mediação como “um método de condução de conflitos, voluntário e sigiloso, aplicado por um terceiro neutro e especialmente treinado, cujo objetivo é restabelecer a comunicação entre as pessoas que se encontram em um impasse, ajudando-as a chegar a um acordo”.

Como forma de condução de conflitos, apresenta vantagens importantes em comparação com a conciliação e a arbitragem, pois propicia a retomada da autodeterminação das pessoas com relação às próprias vidas. Fundamentalmente é a isto que a mediação se propõe. Delegou-se poder decisório demais ao Estado, na figura dos tribunais com seus juízes, ou mesmo aos advogados. Os mesmos tribunais e juízes estão abarrotados e as pessoas infelizes com sentenças que não as satisfazem, que vêm depois de anos de lutas inglórias entre pseudoganhadores e pseudoperdedores.

Tomemos como exemplo a área de família. Chama-nos a atenção o grande número de separações litigiosas e o não cumprimento de sentenças judiciais. Nas separações, o que se percebe ao se trabalhar com casais e famílias é o quanto as pessoas tentam resolver suas frustrações provenientes de um casamento malsucedido por meio de brigas e disputas, desconsiderando os próprios filhos, que acabam sendo os mais prejudicados.

O juiz, por mais que represente na mente dos envolvidos o “grande pai” idealizado, não consegue extinguir a fonte do litígio, pois o que há é uma distorção de demanda, isto é, usa-se o Judiciário não só para se desfazer um estado – de casado para separado ou divorciado, por exemplo –, mas para se transformar um ser, uma identidade. O acerto de contas que se pretende é o emocional, a guarda que se reivindica não é só dos filhos como pessoas, mas como produtos de uma relação e representantes de um projeto, em que todos, adultos e crianças, carregam o sentimento de fracasso pelo seu desfazimento.

A Associação Americana de Mediação realizou uma estatística nos tribunais dos Estados Unidos, em 1997, e constatou que nos casos de divórcio, nos quais a guarda dos filhos é outorgada à mãe – o que representa a maioria dos casos –, 85% das sentenças em ações de alimentos e guarda não são respeitados.

Muitas hipóteses poderíamos levantar para explicar tal ocorrência, mas o essencial é pensarmos que, seja por qual motivo for, as sentenças não atenderam às reais necessidades das pessoas envolvidas, suas prioridades e interesses, pois se o tivessem feito, teriam sido mais consideradas.

O mediador é um facilitador do processo de retomada de um diálogo truncado. Diversamente do árbitro ou do conciliador, ele não interfere diretamente, mas ajuda as partes – no caso de processos judiciais –, ou as pessoas que se encontram em situação de disputa a encontrar, elas mesmas, as saídas e alternativas que mais lhes convêm. Por meio do uso de técnicas específicas e utilização de conhecimentos advindos de várias disciplinas e ciências como a psicologia, psicanálise, direito, teoria da comunicação, teoria do conflito etc., o mediador restabelece as ligações que foram rompidas pela má condução ou exacerbação de um conflito. Ele “cataliza” a comunicação.

A mediação é um procedimento realizado por profissionais capacitados para tal, que podem ser psicólogos, advogados, médicos, administradores de empresas, assistentes sociais e outros. O objetivo é facilitar o diálogo, colaborar com as pessoas e ajudá-las a comunicar suas necessidades, esclarecendo seus interesses, estabelecendo limites e possibilidades para cada um, tendo sempre em vista as implicações de cada decisão tomada a curto, médio e longo prazo.

Desse modo, a probabilidade de as sentenças judiciais serem cumpridas aumenta significativamente, pois os acordos provêm do trabalho das pessoas e são construídos por elas, e não impostos. Tudo isso se traduz não só em economia de tempo e de recursos materiais, mas também, e principalmente, em uma redistribuição mais adequada de recursos emocionais. Representa, ainda, um instrumento valioso de prevenção da violência doméstica, da depressão infantil e da delinqüência juvenil, que tão comumente seguem-se aos litígios familiares.

Vimos como a Mediação pode ajudar na questões que chegam ao Direito de Família, porém pode ser utilizada em todas as situações em que haja controvérsias. Portanto, em qualquer situação do convívio humano, em diferentes contextos como nas empresas, escolas, hospitais, comunidades, relações internacionais, etc."

Eliana Riberti Nazareth
In: "Pailegal.net"

Ministro da Justiça inaugura Centro de Mediação e Arbitragem em Óbidos

O Ministro da Justiça, Alberto Costa, estará em Óbidos na segunda-feira, dia 30, para assinar protocolos para a criação de dois serviços do seu ministério naquele concelho e no das Caldas.

Nas instalações do Tribunal das Caldas passará a funcionar o “INFOJUS”, um posto de informação ao cidadão no âmbito da Justiça, enquanto que junto à Câmara de Óbidos passará a haver o Centro de Mediação, Conciliação e Arbitragem do Oeste (CEMEAR), que tem como objectivo disponibilizar serviços de resolução extrajudicial de conflitos.

“Quem está nos tribunais percebe que o afastamento entre os cidadãos e a justiça é, muitas vezes, resultado da forma como são atendidos, tanto no próprio tribunal como em qualquer outro espaço, para obter uma informação que tenha a ver esta área” segundo Isabel Baptista, Juíza do Tribunal das Caldas da Rainha e Presidente te da Associação Forense do Oeste.

Para colmatar esta situação, e por considerar que existem formas alternativas de resolução de conflitos, a AFO há um ano que trabalha na procura de novas soluções.

Para a presidente da AFO, Isabel Baptista, é importante ter em conta as formas alternativas da resolução de conflitos, “não como uma forma de diminuir a pendência dos tribunais, mas na medida em que conseguimos envolver os cidadãos na resolução dos seus próprios problemas”. E em última instância, através da mediação e da arbitragem, está também a diminuir a litigância dos tribunais.

Isabel Baptista destaca que a associação forense sempre defendeu, em conjunto com a autarquia, que deveria ficar sediado em Óbidos, que era a comarca que não tinha tribunal. O CEMEAR Óbidos – Centro de Mediação, Conciliação e Arbitragem do Oeste, consiste numa parceria entre a Associação Forense do Oeste, a Concórdia – Centro de Conciliação e Mediação de Conflitos e o IMAP – Instituto de Mediação e Arbitragem de Portugal, com o objectivo de disponibilizar, a todos os interessados, serviços de resolução extrajudicial de conflitos.

Inicialmente o projecto foi apresentado a cinco autarquias, mas “Óbidos estava apaixonada pelo processo e contámos com a adesão quase sem limites do Presidente, que imediatamente cedeu o espaço”, disse a responsável. Este serviço terá competência internacional, podendo, por exemplo, mediar um conflito de um cidadão português que trabalha na Bélgica, mas que tem uma casa na região Oeste onde lhe está a ser cobrada uma factura de electricidade que ele entende que não é devida.

No futuro este centro poderá vir a estabelecer parcerias com outros países, nomeadamente com os PALOP.

O INFOJUS será um espaço de acesso à justiça, que tem por finalidade prestar, de forma gratuita, serviço de informação jurídica e de encaminhamento para as entidades devidamente habilitadas para a resolução das questões apresentadas. O primeiro a funcionar no país ficará instalado no Tribunal das Caldas da Rainha e terá a tempo inteiro um advogado a prestar este serviço à comunidade, pago pelo Ministério da Justiça.

Também os funcionários das autarquias que constam no protocolo terão formação assegurada. De acordo com Isabel Baptista, será garantido, por parte das Câmaras, o equipamento de vídeo-chamada, garantindo a informação atempada nos vários locais.

Por exemplo, um funcionário da câmara que esteja em Peniche, prestará uma primeira informação para a qual esteja habilitado, mas “depois para todas as dúvidas que daí resultarem haverá uma vídeo-chamada directamente para o posto de atendimento nas Caldas”, explicou. A pessoa poderá também ser aconselhada sobre a finalidade de uma consulta jurídica, qual a lista de advogados que poderá consultar, ou ser encaminhada para as autoridades policiais, as comissões de protecção, conservatórias, autarquia ou para a segurança social.

Este serviço irá funcionar nos dias úteis, de forma ininterrupta, entre as 10 e as 17 horas, estando o atendimento assegurado por uma escala de advogados e advogados estagiários. Durante o próximo mês serão seleccionados os candidatos, que receberão depois formação para esclarecer a população quanto às vantagens deste projecto de aproximação dos cidadãos á justiça.

Na segunda-feira será também celebrado um protocolo entre a AFO e a ESAD para a realização de um concurso para a realização de um logotipo do INFOJUS.

Também o presidente da Câmara de Óbidos, Telmo Faria, mostra a sua satisfação em ver criada “uma estrutura e mecanismos que possam ajudar a resolver os problemas das pessoas sem que elas tenham que passar pelo tribunal”. Destacou a necessidade baixar o número de processos que existem “e entopem os tribunais”, dando o exemplo do que se passa com o das Caldas da Rainha, onde milhares de processos se encontram em espera.

"Gazeta das Caldas" 27/10/2006