29 agosto 2006

Mediação vai ser aprofundada como meio de resolução de conflitos

A mediação penal está prestes a chegar a Portugal com o avanço de um projecto experimental, cuja legislação está a ser preparada pelo Governo. O objectivo é resolver crimes sem o recurso ao tribunal, por via de um acordo entre as partes. No Porto, funciona já um projecto-piloto, cujos resultados têm sido positivos.

A Escola de Criminologia da Faculdade de Direito do Porto iniciou a mediação penal em Portugal em 2004, através de um protocolo com o Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) do Porto. Os primeiros casos chegaram em 2005 e, à semelhança do que está previsto no anteprojecto de lei, só crimes puníveis até cinco anos de prisão podem ser resolvidos.

"Os casos com menores de 16 anos e de violência doméstica foram excluídos", explicou ao DN Josefina Castro, directora adjunta da Escola de Criminologia e uma três pessoas que fazem mediação. "A violência doméstica ficou de fora porque há uma desigualdade grande entre arguido e vítima. A mediação pressupõe duas partes iguais", justificou.

Josefina Castro adiantou que a mediação, enquanto forma de justiça restaurativa, tem "como centro a vítima e o que é possível fazer para reparar o dano, ao contrário da justiça convencional em que a vítima é apenas uma testemunha". Mas é preciso cuidado na abordagem. "É identificada com a ideia de perdão e, por vezes, as pessoas ficam de pé atrás. Não é esse o objectivo."

No total de 24 processos recebidos, a maioria tem como base crimes semipúblicos, como ofensas à integridade física, dano, ameaças ou injúrias. Normalmente, envolvem casos de vizinhança. "Em quase todos, as pessoas já se conheciam antes", explicou a mediadora.

O processo começa com um contacto prévio do DIAP a anunciar às pessoas que o caso vai para mediação. As pessoas têm de consentir, depois há sessões prévias com cada uma das partes. Depois juntam-se face a face e procuram, com ajuda do mediador, chegar a um acordo. Caso falhe, o processo regressa ao DIAP e nada se diz sobre porque falhou. Com acordo, resolve-se com a desistência de queixa.

O acordo implica, por regra, um pedido de desculpas. Para já, em 24 casos, foram conseguidos 12 acordos. Josefina Castro destaca que as pessoas acabam por captar bem os pressupostos da mediação: "Até conseguem perceber as razões da outra parte."

Um dos casos exemplificativo do que pode falhar envolveu uma situação de danos materiais num veículo e ofensas à integridade física: "Era uma história longa de conflito. Houve cedências até certo ponto e até foram aceites as desculpas. Parecia tudo resolvido. Mas não foi assim. O montante da indemnização gerou discórdia e levou uma das partes a preferir ir para tribunal."

David Mandim
Diário de Notícias 28 de Agosto 2006

28 agosto 2006

Regulamento do Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz

Foi hoje publicado em Diário da República o regulamento do Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz.

Consultar em:

http://www.dre.pt/pdf2s/udr/2006/08/2S165A0000S00.pdf

24 agosto 2006

"O que é preciso é diversificar os meios alternativos de resolução de conflitos"!

Excerto de entrevista a Rogério Alves Bastonário da Ordem dos Advogados
in: "CORREIO DA MANHÃ" em 6-08-2006

João Vaz– Não há maneira de tornar a Justiça mais rápida?

Rogério Alves – Há várias maneiras. Em primeiro lugar e começando pelas férias judiciais de Verão, já propus ao sr. ministro da Justiça que considere no mínimo a possibilidade de a última quinzena de Julho não ser considerada de férias judiciais mas admitir a suspensão dos prazos, embora se possa marcar julgamentos. Esta solução é praticada em vários países da Europa, nomeadamente na Alemanha.

É também é preciso fazer algo que a revisão do Código de Processo Penal já aponta e que é rejeitar liminarmente processos que são totalmente inúteis. O que é preciso é diversificar os meios alternativos de resolução de conflitos como a Ordem tem dito, seja com mediações, seja com julgados de paz, tribunais arbitrais e outros garantindo o que é tão essencial nessas instâncias como nos tribunais judiciais: o patrocínio do advogado.

Decisivo ainda é simplificar os processos. É preciso como se diz em linguagem de Verão retirar as gorduras e manter o músculo que em Justiça é a garantia do contraditório e de um efectivo direito de recurso. Lamentavelmente continua-se a confundir o retirar das formalidades inúteis com o ataque aos recursos, quando estes são formalidades úteis porque constituem uma forma de purificar a Justiça e garantir a superior qualidade das decisões. O recurso é um direito natural, mesmo que não haja razão.

18 agosto 2006

Brasil: Cartórios farão mediação prévia de pequenas causas

Fernanda Mathias
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A Anoreg (Associação dos Notários e Registradores de MS) está lançando esta manhã em Campo Grande o projeto “Registrando Cidadania à Comunidade”, em parceria com Associação dos Magistrados Brasileiros. Segundo explicou esta manhã ao programa “94 Notícias”, da FM 94, o presidente da Anoreg, presente Paulo Pedra, o projeto piloto foi criado pela Associação dos Magistrados do Brasil, para desafogar o juizado de pequenas causas.

Os cartórios passarão a fazer declaração de pequenos conflitos entre as pessoas. O objetivo é resolver o problema fazendo mediação pára-processual, evitando que pequenas causas virem processos judiciais.

Ele citou um exemplo: pessoas processadas por R$ 100, e que perderam contato com o credor, podem procurar o cartório para fazer a mediação, fazer o depósito do dinheiro e resolver o problema em menos tempo, pois os processos geralmente demoram de cinco a seis meses em Mato Grosso do Sul.

Também estão englobados casos como pequenos conflitos de trânsito, dívidas e discussões, que podem ser resolvidos por acordo através de um termo no cartório, que passa a ter título executivo. Hoje, 35 cartorários serão capacitados por professores de Brasília (DF), para que em breve seja instalado o projeto. Cada caso terá uma tabela de preços, que varia de região para região.

11 agosto 2006

Brasil: Ministério da Justiça apoia mediação de conflitos fora do Judiciário

O secretário de Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça, Pierpaolo Cruz Bottini, destacou na manhã desta quinta-feira (10/8), no seminário Justiça e Comunidade, a necessidade de tomar soluções para conflitos fora do Poder Judiciário. Ele sugere que a própria comunidade tome suas decisões.

Segundo Bottini, o Ministério da Justiça apoia o PL 4827/98, da deputada Zulaiê Cobra (PSDB-SP), que institucionaliza e disciplina a mediação, como método de prevenção e solução consensual de conflitos. Dessa forma, a pessoa que queira ajuizar uma acção poderá utilizar a mediação antes da formação de processo no Poder Judiciário. O mediador poderá ser qualquer pessoa que tenha formação técnica ou experiência prática para resolver o conflito.

O projecto foi aprovado na Câmara em Outubro de 2002 e, no Senado, recebeu um substitutivo. Por esse motivo, retornou à Câmara para análise das alterações propostas.

Durante todo o dia, juízes, promotores, policiais e outros profissionais discutirão formas de aplicar a Justiça e de resolver conflitos, principalmente em pequenas comunidades.


Diário da Notícia - www.diariodanoticia.com.br

Brasil: Dirigentes do Sebrae visitam Tribunal de Justiça

O Director Superintendente do Sebrae no Acre, Cassiano Marques de Oliveira e o gerente de Políticas Públicas do Sebrae- Nacional, Bruno Quick, visitaram nesta segunda-feira o presidente do Tribunal de Justiça do Acre, desembargador Samoel Martins Evangelista e a vice-presidente da corte e coordenadora da Justiça Itinerante, desembargadora Eva Evangelista.

Cassiano e Quick estiveram na sede do TJ acompanhados do coordenador de Unidades de Desenvolvimento Setorial do Sebrae Acre, Francisco Bezerra, para discutir parcerias do Sebrae com o TJ na área de mediação de conflitos entre pequenos e micro empresários do Estado.

Os dirigentes do Sebrae também apresentaram proposta de parceria através de financiamento de projectos de mediação e conciliação para assegurar aos usuários do Sebrae Acre, um melhor atendimento na solução dos seus problemas.

A proposta teve boa receptividade da desembargadora Eva Evangelista, que reafirmou sua defesa da importância da justiça comunitária e da mediação na celeridade da justiça e também do desembargador Samoel Evangelista.

Outra proposta apresentada refere-se à realização de um grande evento da Justiça Comunitária Itinerante nos moldes do Projecto Cidadão, mas voltados para pequenos e micro empresários do Estado, em comemoração aos 10 anos da implantação da Lei de Arbitragem no país.

“A garantia de reposição de direitos - e o tempo e os custos que as empresas gastam para isso - é um dos itens que o Banco Mundial avalia para compor o ambiente favorável a negócios de um país”, defende Cassiano Marques, reconhecendo que, após algumas tentativas de realizar a mediação sem o apoio da Justiça, o Sebrae busca agora fortalecer a parceria com o poder judiciário, para facilitar o acesso dos serviços aos pequenos empresários do Estado.


O Sebrae

O Sebrae, Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas, trabalha desde 1972 pelo desenvolvimento sustentável das empresas de pequeno porte. Para isso, a entidade promove cursos de capacitação, facilita o acesso a serviços financeiros, estimula a cooperação entre as empresas, organiza feiras e rodadas de negócios e incentiva o desenvolvimento de actividades que contribuem para a geração de emprego e renda. São centenas de projectos geridos pelas Unidades de Negócios e de Gestão do Sebrae.

Unidades do Sebrae Unidade de Políticas Públicas Unidade de Gestão Estratégica Unidade de Marketing e Comunicação Assessoria Jurídica Auditoria Secretaria Geral Unidade de Assessoria Internacional Directoria de Administração e Finanças Unidade de Capacitação Empresarial Unidade de Acesso à Inovação e Tecnologia Directoria Técnica Unidade de Acesso a Mercados Unidade de Acesso a Serviços Financeiros Indústria Comércio e Serviços Agronegócios e Territórios Específicos Unidade de Atendimento Individual


Hoje, o Sebrae actua no Brasil inteiro, com unidades nos 26 estados e no Distrito Federal, que formam um sistema de ampla capilaridade, com aproximadamente 600 pontos de atendimento, do extremo Norte ao extremo Sul do País.

http://www.sebrae.com.br/br/osebrae/osebrae.asp

10 agosto 2006

Viva Rio lança portal e biblioteca virtual

O movimento Viva Rio lança nesta quarta-feira, às 10 horas, em sua sede no bairro da Glória, o portal e biblioteca virtual Comunidade Segura, um ambiente interativo com conteúdo vasto e aberto sobre segurança pública, controle de armas, juventude em violência armada. O conteúdo inclui outros temas, como mediação de conflitos e cultura de paz, além de questões como gênero e saúde.

O Comunidade Segura servirá tanto ao público leigo quanto a pesquisadores e profissionais da área de segurança e permitirá discussões democráticas e bem fundamentadas. O portal tem versões em três idiomas ( português, espanhol e inglês) e cobertura internacional.

O secretário especial dos Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, e o diretor executivo do Viva Rio, Rubem César Fernandes estarão presentes à apresentação do projeto.

Da Agência Brasil

04 agosto 2006

A obrigatoriedade das decisões judiciais

O texto analisa os fundamentos legais que obrigam o Poder Judiciário a proferir uma decisão ao caso concreto posto em juízo.

Valmir Bigal in DireitoNet

03/08/2006


INTRODUÇÃO

O homem é um ser sociável e, devido a essa natureza, por não alcançar a plenitude isoladamente, está obrigado a manter contacto com outros homens. Assim sendo todas as pessoas dependem do intercâmbio, da colaboração e confiança recíproca. Inobstante, o homem é um animal insatisfeito, insatisfeito precisamente em relação aos que convivem com ele.

Desta forma desde que se formaram os primeiros círculos sociais, na remota antiguidade, deve ter-se delineado a figura do juiz, pessoa encarregada de resolver questões surgidas entre os membros do grupo.

Inevitáveis os conflitos de interesses, o choque das paixões, naturalmente alguém havia de ser convocado a diminuir desavenças, sob pena de ser colocada em risco a própria manutenção da vida em sociedade.

Nos grupos primitivos, a ordem interna era mantida por um chefe, dotado de qualidades que o destacavam diante do grupo, tocando a ele, entre outras prerrogativas, o julgamento de dissídios e imposição de penalidades.

O professor André Franco Montoro, em livro clássico, escreveu: “(...) não se pode conceber uma sociedade humana em que não haja ordem jurídica, mesmo em se tratando de um estado rudimentar. Isto se exprime em latim pelo adágio conhecido Ubi soccietates, ibi jus (Onde há sociedade, há direito)”. (Introdução à Ciência do Direito. 24ª edição, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 1997, p. 54).

A progressiva complexificação social, além do aumento populacional e territorial obrigava a delegação de certas atribuições a pessoas de confiança do chefe ou príncipe, que cada vez mais se encontravam impossibilitados de atender pessoalmente a todas as demandas sociais. Permanecia a autoridade nele, mas o seu exercício tinha de ser dividido entre várias pessoas. Tal fato é um imperativo natural da especialização de funções e da divisão do trabalho.

O Ministro Mário Guimarães entreviu nesses fatos o surgimento da função de julgar, tão antiga como a própria sociedade.

“Na família, forma rudimentar da coletividade, juiz é o pai. No clã, é o chefe, em cujas mãos se concentram, habitualmente, todos os poderes, é o rei, o general, o sacerdote, o legislador, o juiz”.

“Quando se torna a grei mais numerosa, crescem e se complicam as relações humanas. O rei, absorvido por outras atividades, máxime as de guerra, não terá tempo de prover a todos os dissídios do seu povo. Cometerá tais funções a um preposto. Destaca-se, nesse momento, a entidade do juiz....” (O Juiz e a Função Jurisdicional. Rio, 1958, p. 19).

A Justiça de mão própria pela tendência a exceder os limites do necessário à defesa de cada um nos casos concretos, não podia subsistir, havia de ser substituída por outro sistema, no qual o juiz seria pessoa alheia aos interesses dos litigantes.

A princípio com atribuições compreendendo questões administrativas e religiosas, foi-se restringindo a função judicante ao mesmo tempo em que se desenvolviam as relações sociais, até chegar-se à situação atual, em que se destaca um Poder próprio, autônomo, composto de órgãos singulares e colegiados, servido por não menos numeroso conjunto de auxiliares especializados: o Poder Judiciário.

O Estado, supressa a Justiça pelas próprias mãos daquele que se diz vítima de ameaça ou seu direito, a todos promete o remédio da prestação jurisdicional, isto é, a tutela jurisdicional, direito de defender em juízo o que é seu, o que lhe pertença, na forma prescrita em lei.

Assim, o Estado tomou para si o poder e o dever de, com exclusividade, resolver de forma imparcial os conflitos de interesses entre os particulares e até mesmo os conflitos de interesses entre o Estado-Administração e os administrados.

Salvo casos excepcionais, só aos juízes compete dirimir as dissidências, os conflitos, vale dizer, o Estado possui o monopólio da jurisdição, isto é, somente o Estado-Juiz possui a prerrogativa de dizer o direito aplicável a um fato concreto, solucionando um conflito de interesses em caráter definitivo.

Nenhum juiz, entretanto, prestará a tutela jurisdicional senão quando a parte ou o interessado a requerer, nos casos e formas da lei. O lesado tem de comparecer diante do Poder Judiciário, o qual, tomando conhecimento da controvérsia, se substitui à própria vontade das partes que foram impotentes para se autocomporem. O Estado, através de um de seus Poderes, dita, assim, de forma substitutiva à vontade das próprias partes, qual o direito que estas têm de cumprir;

O juiz exerce a jurisdição com independência jurídica e política. Livre da submissão a qualquer dos Poderes ou a qualquer entidade, profere suas decisões, formula e emite seus juízos obedecendo apenas às prescrições da lei e aos ditames de sua consciência.


A FUNÇÃO JURISDICIONAL

Primitivamente, o Estado era fraco e limitava-se a definir os direitos. Competia aos próprios titulares dos direitos reconhecidos pelos órgãos estatais defendê-las e realizá-los com os meios de que dispunham.

Eram os tempos da justiça privada ou justiça pelas próprias mãos, que, naturalmente, era imperfeita e incapaz de gerar a paz social, pois a defesa do direito por atividade própria acaba transmudando-se no império do mais forte. Vencia a lide aquele que intimidasse o adversário. O que valia era a força bruta, e não o direito.

Com o surgimento da escrita, gravaram se as férreas normas da legislação mosaica expressa no Pentateuco e a Lei de Talião, consagrada no ordenamento babilônico, mas comum a todos os povos da época. Com a evolução das relações sociais nos primórdios da civilização, já por volta de 1711 e 1699 a. C., com o Código de Hamurabi, temos uma das primeiras composições das leis escritas, com tribunais minimamente organizados, onde é possível se identificar uma forma de arbitramento.

A necessidade de se pacificar o grupo e estabelecer a ordem jurídica, levou a sociedade a desenvolver uma intervenção no campo da administração da justiça. Na luta contra a autodefesa, o Estado começou a discipliná-la e limitá-la, para depois excluí-la por absoluto. João Paulo Lucena, citado por Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, afirma ser assim que surge o interesse social, excludente dos conflitos e perturbação da ordem pública que representava a justiça privada, oriundo de dois fatores primordiais: a proibição expressa pelo Estado e a renúncia do indivíduo na realização da justiça particular (Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, Elementos para uma nova Teoria Geral do Processo, p. 90).

Fazia-se, à época da idade média, imperiosa a limitação do poder então absoluto, sendo, assim, concebida a teoria da separação dos poderes, que representa hoje um dos pilares do constitucionalismo moderno.

Desde Aristóteles reconhece-se que a função estatal é suscetível, em razão das diferenças que apresenta, de ser dividida num certo número de categorias, agrupando cada qual aqueles atos do Estado que apresentam, entre si, traços de uniformidade. O próprio Aristóteles já fixava em três essas categorias.

O primeiro a elaborar uma teoria da divisão de poderes sistematizada foi John Locke, inspirado na Constituição Inglesa, dizendo ser necessário que as funções do Estado fossem exercidas por órgãos diferentes: Executivo, Legislativo, Confederativo (Relações Internacionais) e Discricionário (atribuições extraordinárias que o governo exercia de acordo com as leis), tendo por fundamento a limitação do ente juspolítico.

Neste aspecto, cabia à expressão jurisdicional do poder declinar o direito, mesmo quando o Estado-Administração fosse parte na relação processual. Coube ao Poder Judiciário a predominância da jurisdição, vale ratificar, dizer o direito.

Foi, no entanto, Montesquieu quem melhor sistematizou a chamada repartição dos poderes estatais, propondo um sistema de organização e funcionamento do poder estatal de modo que cada órgão desempenhasse uma atividade distinta, ao mesmo tempo em que a atividade de cada qual servisse de contenção da atividade de outro órgão.

A preocupação de Montesquieu era a defesa da liberdade contra o poder político, único existente na época. Para alcançar esse fim dividiu o exercício do poder entre as diferentes classes sociais (estamentos) que constituíam a sociedade, única forma eficaz de impedir a opressão de uma classe por outra.

Hoje se fala de separação de órgãos, especialização de funções e, sobretudo, cooperação entre órgãos, para que o poder limite o poder. Então, quando se fala em “separação de poderes”, não se cogita de exclusividade, mas preponderância de funções.

Sendo ilimitadas as pretensões humanas e limitados os bens para satisfazê-las, inevitável é o conflito, situação em que surge a insatisfação. Com isso, a existência de uma ordem reguladora, como o é o direito, é insuficiente ante a possibilidade do seu descumprimento. Mas a insatisfação é fator anti-social por excelência, provocando a desagregação e a instabilidade social. Por isso é necessária a criação de mecanismos destinados a tornar suportáveis os conflitos sociais.

No direito primitivo, esses mecanismos eram a autocomposição e a autodefesa. Como o Estado de Direito não tolera a justiça feita pelas próprias mãos dos interessados, caberá à parte deduzir em juízo a lide existente e requerer ao juiz que a solucione na forma da lei, fazendo, de tal maneira, a composição dos interesses conflitantes, uma vez que os respectivos titulares não encontraram um meio voluntário e amistoso para harmonizá-los.

Tomando conhecimento das alegações de ambas as partes o magistrado definirá a qual deles corresponde o melhor interesse, segundo as regras do ordenamento jurídico em vigor, e dará composição ao conflito, fazendo prevalecer a pretensão que lhe seja correspondente.

Saliente-se, ainda, que no direito moderno jogam papel bastante relevante a defesa de terceiro, a mediação e o processo. Daí o papel da jurisdição, função do Estado moderno.

Por outro lado desde que o Estado privou os cidadãos de fazer atuar seus direitos subjetivos pelas próprias mãos, a ordem jurídica teve que criar para os particulares um direito à tutela jurídica estatal. Em conseqüência, passou o Estado a deter não apenas o poder jurisdicional, mas também assumiu o dever de jurisdição.

Em renomada obra, Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martins, mencionando o festejado mestre Arruda Alvim, prelecionam que podemos, assim, afirmar que a função jurisdicional é aquela realizada pelo Poder Judiciário, tendo em vista aplicar a lei a uma hipótese controvertida mediante processo regular, produzindo, afinal, coisa julgada, com o que substitui, definitivamente, a atividade e vontade das partes (Comentários à Constituição do Brasil Promulgada em 13 de outubro de 1998. São Paulo, 1997, 4º volume, tomo III, p. 13).

Cândido Rangel Dinamarco define jurisdição como: “... a atividade pública e exclusiva com a qual o Estado substitui a atividade das pessoas interessadas e propicia a pacificação de pessoas ou grupos em conflito, mediante a atuação da vontade do direito em casos concretos” (Fundamentos do Processo Civil Moderno. São Paulo, 2000, p. 115).

Ao criar a jurisdição no quadro de suas instituições, visou o Estado a garantir que as normas de direito substancial contidas no ordenamento jurídico efetivamente conduzam aos resultados enunciados, ou seja: que se obtenham, a experiência concreta, aqueles precisos resultados práticos que o direito material preconiza. E assim, através do exercício da função jurisdicional, o que busca o Estado é fazer com que se atinjam, em cada caso concreto, os objetivos das normas de direito substancial. Es outras palavras, o escopo jurídico da jurisdição é a atuação das normas de direito objetivo.

A idéia de que o Estado procura a realização do direito material há de coordenar-se com a idéia de que os objetivos buscados são, antes de mais nada, objetivos sociais: trata-se de garantir que o direito objetivo material seja cumprido, o ordenamento jurídico preservado em sua autoridade e a paz e ordem na sociedade favorecidas pela imposição da vontade do Estado. O interesse que se satisfaz através do exercício da jurisdição é, pois, o interesse da própria sociedade.

As considerações acima expostas coadunam-se perfeitamente à moderna teoria da jurisdição de Gian Antônio Micheli que apresentou como nota distintiva do conceito de jurisdição, não tanto o caráter da substitutividade, como afirmou Chiovenda, mas sim o da imparcialidade do órgão que profere a decisão. A norma a aplicar, é, para a administração pública, a regra que deve ser seguida para que uma certa finalidade seja alcançada. Já para o órgão jurisdicional, a mesma norma passa a ser o objeto de sua atividade institucional, no sentido de que a função jurisdicional se exercita com o único fim de assegurar o respeito ao direito objetivo.

A jurisdição, para este autor, tem a sua principal característica não só na qualidade de terceiro do juiz – terzietà, mas também nos princípios da demanda e do contraditório. O juiz exerce a clara figura do terceiro imparcial, retirando o poder de decisão dos envolvidos ou partes, passando este poder a alguém que, não estando envolvido no conflito, pode melhor solucioná-lo.

A crítica contra a teoria desenvolvida por Micheli foi o questionamento de como o juiz pode representar um órgão imparcial, quando decide acerca de questões em que o próprio Estado é parte. Esta crítica é rechaçada lembrando-se ser o Judiciário um poder independente dos demais.


O DIREITO DE AÇÃO

O Estado almeja ter, numa perspectiva extremamente dogmática, o monopólio da produção e aplicação das normas jurídicas e quer ver efetivada a prevalência das fontes estatais do direito (lei e jurisprudência) em detrimento das demais fontes.

Para tanto, existem dogmas, tidos como “verdades inquestionáveis e indiscutíveis”, se bem que, na verdade, não o sejam. O compromisso do direito, como um todo, ao final, não é tanto com a verdade, mas com a dissolução de conflitos, a fim de tornar viável uma convivência intersubjetiva.

Há, então, a essencialização de dois princípios: princípio da inegabilidade dos pontos de partida (dogmas), também denominado princípio da negação; e o princípio da proibição do “non liquet”, neste o Estado decide tudo, sempre.

Em razão de o Estado ter assumido o monopólio da justiça, proibindo a autotutela, surge, em contrapartida, a necessidade de armar o cidadão com um instrumento capaz de levar a cabo o conflito intersubjetivo em que está envolvido. Esse direito é exercido com a movimentação do Poder Judiciário, que é órgão incumbido de prestar a tutela jurisdicional.

Através da função legislativa o Estado estabelecea ordem jurídica, fixando em forma preventiva e hipotética as normas que deverão incidir sobre as situações ou relações que, possivelmente, venham a ocorrer entre os homens no convívio social.

Assim o ordenamento jurídico atribui aos cidadãos “seus direitos” prefixando as pretensões que cada um pode ostentar diante dos outros, bem como estabelece os deveres dos vários integrantes do grupamento social juridicamente organizado.

Quando o artigo 5º, inciso XXXV da Constituição da República solenemente assegura que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”, não só vem garantido o direito de ser pedida a tutela jurisdicional, com base na afirmação da existência de ato lesivo a direito individual, como também afirmado está que todo cidadão tem o direito de pedir ao Judiciário que obrigue o autor da lesão ou ameaça a reparar o ato danoso que praticou.

Explicito também quanto ao papel tutelar da jurisdição é o Código de Processo Civil, no seu artigo 2º, ao dispor, textualmente, que é tarefa da jurisdição civil prestar a tutela jurisdicional, quando a parte a requerer nos casos e formas legais.

Tem, assim, o autor, por meio do direito público subjetivo de ação que lhe foi conferido pelo Estado, um direito em face do próprio Estado, e, correlatamente, existe um dever da parte deste para com o indivíduo de lhe prestar a tutela. Esta regra é valida também para o réu no sentido de ser objeto de decisão, e, bem assim, qualquer outros incidentes levantados pelo demandado.

Destarte frente à violação de um bem juridicamente protegido, não cabe outra atividade que não a invocação da devida tutela jurisdicional. Impõe-se a necessária utilização da estrutura preestabelecida pelo Estado – o processo judicial – em que, mediante a atuação de um terceiro imparcial, cuja designação não corresponde à vontade das partes e resulta na imposição da estrutura institucional, será solucionado o conflito e sancionado o autor.

Ressalte-se que mais do que imparcial (porque “impessoalidade” é requisito de qualquer agente que atue em nome do Estado em qualquer de suas funções soberanas e não tributo apenas dos juízes) o órgão jurisdicional é sempre um terceiro diante da relação material controvertida. Mesmo quando o juiz aprecia uma causa em que o Estado seja parte, a função jurisdicional fica a cargo de um organismo completamente estranho à Administração Pública e cujo único comprometimento é com a ordem jurídica.

Segundo a teoria do direito da ação, concebida pelo eminente processualista italiano Enrico Túlio Liebman, o autor não precisa ter razão para provocar a atividade jurisdicional, já que o direito processual de ação existe, mesmo que o direito material alegado não exista. Ademais, aquele corresponde a um agir contra o titular do poder jurisdicional, que é o Estado, sendo o direito de ação, em última análise, o direito à jurisdição.

A pedra de toque do direito de ação para Liebman é o direito a uma decisão de mérito sobre a demanda; assim, partindo do pressuposto de ser a ação um direito à jurisdição, é mister saber onde começa a jurisdição; para o autor em testilha, esta só existe quando o juiz pronuncia sobre o mérito – decide sobre a lide, seja esta decisão favorável ou contrária ao autor.

Dessa forma, o exercício da ação cria para o autor o direito à prestação jurisdicional, direito que é um reflexo do poder-dever do juiz de dar a referida prestação jurisdicional.

Pode-se, com isso, dizer que o direito fundamental à ação é a faculdade garantida constitucionalmente de deduzir uma pretensão em juízo, e, em virtude dessa pretensão, receber uma resposta satisfatória (sentença de mérito) e justa, respeitando-se, no mais, os princípios constitucionais do processo (contraditório, ampla defesa, motivação dos atos decisórios, juiz natural, entre outros).

Digna de comento é a teoria do direito de ação de Ovídio Araújo Baptista da Silva, segundo o qual a ação não se confunde com o direito subjetivo público de provocar a tutela jurisdicional. Segundo esse processualista “a ação não é um direito subjetivo público pela singela razão de ser ela própria a expressão dinâmica de um direito subjetivo público que lhe é anterior e no qual ela mesma se funda, para adquirir sua pressuposta legitimidade”.

E mais adiante complementa: “a ação será, em qualquer caso, o exercício de um direito preexistente ou simplesmente deixará de ser ação legítima, fundada em direito. Tenho ação processual por que antes a hei de ter direito subjetivo público para exigir que o Estado me preste tutela capaz de tornar efetivo meu direito, cuja realização privada o próprio Estado tornou impossível”.

Sob a dicção de que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”, a Constituição da República empalmou o princípio da inafastabilidade da jurisdição, que, em síntese, de um lado outorga ao Poder Judiciário o monopólio da jurisdição, e, de outro, faculta ao indício o direito de ação, ou seja, o direito de provocação daquele.


METODOLOGIA JURÍDICA

O termo metodologia tem dois significados. Os primeiros são os modos de investigação que uma determinada ciência utiliza. O outro, as doutrinas que sistematizam o conhecimento científico e a própria transformação da realidade.

O primeiro é o ponto de vista estritamente técnico, o que os juristas na prática realizam em uma ordem jurídica como a nossa; também conhecido como ponto de vista “dogmático” porque parte do princípio da inegabilidade dos pontos de partida, segundo o qual não se deve discutir as premissas do direito positivo, posto e positivado pelo Estado.

Essas premissas justificam-se no plano sociológico, isto é, pela natureza tácita de normas que exprimem algo subentendido pela coletividade.

As leis, as regras e os costumes em vigor (incluindo as normas não redigidas que servem de base para a aplicação da lei) repousam, em primeiro lugar na certeza de que seu cumprimento é a garantia do bem-estar tanto do indivíduo como da comunidade, e na confiança de que são atingidos determinados objetivos, acerca dos quais existe um indiscutível consenso.

Evidentemente as normas nunca são totalmente efetivas, não conseguindo evitar que a ordem seja violada pelo conflito, situação que ocorre com freqüência nas sociedades modernas. E quando a ordem social é violada, surge a necessidade de ser restaurada, evitando-se sua destruição, o que é alcançado mediante a imposição do direito, tornando efetivos os valores que expressa.

De mencionar-se que a ordem surge da conexão dialética com a realidade social e econômica, que constitui a base da sociedade, estando ínsita em qualquer sociedade, sendo-lhe inerente, já que a realidade social manifesta-se, historicamente, como um todo estruturado, produzindo espontaneamente, as regras que a governam. É a força normativa inseparável da vida social.

A justiça, na atualidade, deve ser realizada de acordo com a lei; mais precisamente de acordo com os princípios do estado de direito, contexto de igualdade no qual o poder e a autoridade do Estado são derivados única e exclusivamente da lei, proibida toda ação ultravires, ou seja, todo ato oficial que ultrapassa os limites juridicamente estabelecidos de poder e autoridade, mesmo quando a ação é realizada com a melhor das intenções e em nome do interesse público.

Levados pela necessidade de tomar decisões com base no direito (que não pode ser colocado em dúvida, em razão das premissas acima mencionadas), os juristas preparam normas e as fórmulas para os órgãos legislativos, executam-nas no vasto âmbito do Poder Executivo e ainda desempenham “funções jurisdicionais”, isto é, ajuízam ações ou normas segundo outras normas. Vista dessa perspectiva, a metodologia jurídica são “atos de decisão”, técnica prático-científica dos processos de decisão orientados por normas, vale dizer, o juiz e o tribunal têm diante de si o infrator e a obrigação de proferir uma sentença.


O “NON LIQUET”

O multicitado artigo 5º, inciso XXXV, da Carta Política, consagra o direito de invocar a atividade jurisdicional, como direito público subjetivo. Não se assegura aí apenas o direito de agir, o direito de ação, mas também o direito de obter do Poder Judiciário a apreciação do pedido posto.
Uma vez provocado, o órgão jurisdicional não pode eximir-se de decidir a questão submetida a sua apreciação, havendo sempre de manifestar-se sobre os pedidos que lhe sejam endereçados, sob pena de violação ao princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, com insculpido na Carta Magna no artigo anteriormente mencionado.

Conforme esclarecimentos de Alexandre de Moraes o Poder Judiciário, desde que haja plausibilidade de ameaça ao direito, é obrigado a efetivar o pedido de prestação jurisdicional requerido pela parte de forma regular, pois a indeclinabilidade da prestação jurisdicional é princípio básico que rege a jurisdição, uma vez que a toda violação de um direito responde uma ação correlativa, independentemente de lei especial que a outorgue (Direitos Humanos Fundamentais. Teoria Geral. Comentários aos artigos 1º ao 5º da Constituição da República Federativa do Brasil. Doutrina e Jurisprudência. São Paulo, 1998, volume 3, p. 197).

Corroborando com esta obrigatoriedade está inscrito no artigo 35 da Lei Orgânica da Magistratura em seu inciso I que são deveres do magistrado: cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais e os atos de ofício e no inciso III que o juiz deve determinar as providências necessárias para que os atos processuais se realizem nos prazos legais, ou seja, a tarefa do magistrado é a de interpretar e aplicar a legislação, dada pelo Poder Político Constituinte.

O juiz está obrigado a julgar, a faze-lo de acordo com as disposições do Código de Processo, aplicando a tutela jurisdicional quando provocado pela parte ou pelo interessado segundo regra geral (no procedat judez ex officio). Não se exime de sentenciar ou despachar, alegando lacuna ou obscuridade na lei. Cabendo-lhe aplicar as normas e, inexistindo estas, desempenhar-se-á do encargo recorrendo á analogia, aos costumes e aos princípios gerais do direito.

Também se infere a obrigatoriedade de apreciar o pedido posto em juízo do quanto disposto artigo 4º da Lei de Introdução ao Código Civil que dispõe na hipótese da lei ser omissa que o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito.

O artigo 126 do Código de Processo Civil, por sua vez, adverte que o juiz não se eximirá de sentenciar ao despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei. Por mais que se desagrade com os dissabores de uma interpretação nem sempre albergadora da tese defendida, a decisão jurídica se impõe. Verifica-se, pois, que, embora não se possa assegurar direito a uma sentença favorável, existe o direito a uma decisão ou sentença mesmo que desfavorável, ou, então, que inadmita mesmo a ação, ou, ainda, que dê pela invalidade do processo.

E se a lei for clara é dever do magistrado interpreta-la e aplica-la, apesar de não encontrar dificuldades. Se a lei for obscura ou ambígua, deverá interpreta-la empregando certa engenhosidade intelectual.

Lacuna pode existir na lei, fórmula mais ou menos perfeita do direito, não, porém, no direito. O juiz nunca pode esquivar-se de sua função, mesmo quando se depara com casos em que a lei é omissa ou possui lacunas. Em seu trabalho de aplicador, o juiz pode ser levado a revelar o direito, integrar a norma jurídica. É-lhe vedado pronunciar o “non liquet”, isto é, que o direito não está revelado, declarado, explicitado.

A expressão “non liquet” é usual na ciência do processo, para significar o que hoje não mais existe: o poder de o juiz não julgar, por não saber como decidir.

O direito é, existe. Cabe ao juiz, técnico em matéria jurídica, enuncia-lo (jura novit cúria), no desempenho de suas funções de prestar a tutela jurisdicional que o Estado a todos promete.

Curiosa a posição de Zitelmann: não é a lei, propriamente dita, que tem lacunas, e sim nosso conhecimento a seu respeito.


CONCLUSÃO

Pelo quanto exposto podemos concluir que o juiz é um agente do poder público subordinado às restrições que lhe são impostas pela organização estatal que tomou para si a função de julgar os conflitos sociais e delegou ao juiz a obrigação de decidir tais conflitos dentro das normas legais vigentes.

Assim, o magistrado tem poderes-deveres, pois os poderes incumbidos ao juiz são intrinsecamente deveres, sem os quais não poderia exercer plenamente o comando jurisdicional que o Estado lhe outorgou.

Cada magistrado, exercendo a função jurisdicional, não o faz em nome próprio e muito menos por um direito próprio: ele é, aí, um agente do Estado (age em nome deste). O Estado o investiu, mediante determinado critério de escolha, para exercer uma função pública; o Estado lhe cometeu, segundo seu próprio critério de divisão de trabalho, a função jurisdicional referente a determinadas causas. E agora não poderá o juiz, invertendo os critérios da Constituição Federal e da lei, deixar de conhecer dos processos que elas lhe atribuíram.

O juiz, atualmente, não pode deixar de julgar. Ainda que nada tenha ficado provado; ainda que não saiba quem tem razão; ainda que não saiba qual das partes é vítima e qual o algoz; ainda que ignore qual das partes o está enganando, o juiz tem o dever de julgar. Não sabe e, entretanto, deve julgar, como se soubesse. “Il giudice decide non perché as ma come se sapesse.” (CARNELUTTI, Franesco. Diritto e Processo. Napoli, Morano, 1958, p. 265).




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TESHEINER, José Maria Rosa. Ônus e Direito Formativo. Disponível em: . Acesso em: 29 mai. 2006.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2003.

03 agosto 2006

Lista provisória das candidaturas de Mediadores habilitados para prestar serviço nos Julgados de Paz

Já foi publicada a lista provisória dos candidatos admitidos.

Para consultar, utilizem o seguinte Link:

http://www.mj.gov.pt/sections/destaques/home-ie-esq/concurso-de-seleccao-de

Aspectos gerais sobre mediação, conciliação e arbitragem

1 Introdução

A Constituição Federal Brasileira de 1988 dispõe expressamente no art. 3º, os seus objectivos fundamentais, que devemos construir uma sociedade livre, justa e solidária. Uma sociedade livre, justa e solidária se constrói com um poder judiciário sólido, ágil e imparcial.
A sociedade está na carência de alcançar a justiça nas diferentes modalidades existentes para que definitivamente possa solucionar suas pendências de maneira eficiente, rápida e com menor onerosidade nas demandas.
O cidadão espera que o Estado responsável para dirimir qualquer tipo de lide o faça de forma eficiente e rápida. Onde entra em cena a formas alternativas para busca de soluções dos conflitos estabelecidos, ou seja, a mediação, a conciliação e a arbitragem. As formas alternativas, sem a participação do Estado, buscam este tipo de solução.
A necessidade de agilidade nas decisões de conflitos de interesses, especialmente na área do Direito privado, obriga a maioria dos Estados a conceberem leis que favoreçam a solução amigável dos conflitos. Pois toda vez que o Estado fica incumbido de solucioná-los, a solução é lenta e num clima contencioso.


2 MEDIACAO

Mediação vem do latim mediare e quer dizer dividir ao meio, repartir em duas partes iguais. Quem primeiro usou a palavra mediador foi Justiniano, em substituição da palavra proxenetas, que eram os mediadores que actuavam nas províncias. Na religião podemos encontrar diversas passagens em que se menciona a figura do mediador. Tendo sido Jesus o seu precursor “... porque há um só Deus, e um só Mediador entre Deus e os homens Cristo Jesus, homem...” ( I Timóteo 2:5)
O melhor exemplo de mediação de tempos idos vai encontrar na China antiga, que usava este instituto para resolver as divergências entre seu povo. Hoje a china já formou um milhão de mediadores que actuam inclusive nas escolas. [1]
A mediação tem como principal característica propiciar oportunidades para a tomada de decisões pelas partes em conflito, utilizando técnicas que auxiliem a comunicação no tratamento das diferenças de forma construtiva e interactiva. O mediador tem a função de aproximar as partes para que elas negociem de forma directa a solução, findando assim, o conflito iniciado com os interesses in casu.
A mediação é uma forma recursal muito eficaz para acabar com uma demanda. Tem que ser confidencial e voluntário, neste processo de busca pela solução a responsabilidade pela decisão mais apropriada cabe as partes envolvidas. Sua aplicação cabe em todo e qualquer ambiente de convivência que venha a gerar conflitos.
Nos tempos actuais o instituto da mediação, começou a ser aplicado nos EUA, difundindo-se para países como o Canadá, a China e alguns países da Europa. Nos países da Europa a mediação já é empregada a mais de cinquenta anos, sendo o meio mais prático e rápido para solução de conflitos.
O sucesso da mediação consiste, não apenas no melhor acordo para as partes, mas na forma como age no emocional das pessoas, desenvolvendo um sentimento de busca pelo que é justo, reconhecendo suas diferenças, para alcançarem à satisfação de seus interesses resolvidos, sem o desejo de vingança ou ressentimento.

3. CONCEITO DE MEDIACAO

A Lei nº 9.307/96 regulamenta a arbitragem no Brasil. Mas não a conceitua de forma explícita, deixando a definição como tarefa para doutrina para suprir este vazio. Para a autora Rozane da Rosa Cachapuz a mediação é:
meio extrajudicial de resolução de conflitos, tem por finalidade a busca da fonte causadora que originou o problema, para juntamente com os envolvidos, encontrar uma solução.[2]

A medição fundamenta-se na soberania da vontade das partes, onde apenas elas são responsáveis pela solução final do conflito. O papel do mediador é intervir quando os recursos das partes em termos de conhecimento e persuasão, não conseguiram chegar a uma solução. Neste momento cabe ao mediador apresentar as partes, algo novo, diferente, para estimular e até mesmo ajudar os interessados para que surjam ofertas e propostas para chegarem a uma solução.
É conduta obrigatória das Juntas de Conciliação e Julgamento no Brasil bem como nos Tribunais Regionais do Trabalho e no Tribunal Superior do Trabalho, quando se trata de dissídios colectivos, actuar como mediadores, para a solução pacifica e justa do conflito, sendo passível de nulidade do julgado se esta função não for exercida, por primeiro.
Com efeito, a mediação, ainda não sendo disciplinada na legislação brasileira, envolve a tentativa das partes em litígio para resolver, suas pendências, com o auxílio de um terceiro, necessariamente neutro e imparcial, que desenvolve uma actividade consultiva, procurando quebrar o gelo entre as partes que, permanecem com o poder de pôr fim ao conflito mediante propostas e soluções próprias.

3.1 Procedimentos da Mediação

Para alcançar seu objectivo, o mediador terá que buscar um mínimo de equilíbrio e bom senso, para oferecer uma solução satisfatória a ambas as partes. Há muita informalidade, dentro da qual o mediador, que não possui o poder decisório, contudo, auxilia as partes a chegarem a um acordo, ouvindo-as em conjunto ou separadamente, de modo a poder compreender suas dúvidas, desejos e necessida­des de fato, bem como suas posições.
O benefício de uma mediação de sucesso está relacionado, directamente, ao atendimento das necessidades e desejos das partes na demanda. Compete ao mediador explorar as medidas objectivas de solução, vez que nelas reside o poder decisório.
Para a instauração da mediação, deverá haver um acordo, por escrito, em vista de tratar-se dum processo voluntário em que a manifestação de vontade de ambas as partes deve confluir em anuência, sob risco de nulidade. No ato do acordo deverá figurar o nome do mediador, o qual já poderá estar designado na “Cláusula Compromissória”. Em caso de resultado positivo, será ele reduzido a termo, especificando de forma clara e precisa todos os pontos e responsabilidades acordados.

4. CONCILIAÇÃO
O termo conciliação vem do latim conciliatione, como sentido de “ato ou efeito de conciliar, harmonizar, sendo o conciliador (coinciliatore) aquele que concilia ou harmoniza conceitos, opiniões ou pessoas, devendo, para tanto unir; aliar, combinar”. Assim, dentro de uma posição muito difícil de estar neutro, equidistante e imparcial, e sem que emita qualquer pré-julgamento, deverá analisar a questão sob os aspectos técnicos, sopesar os pontos controversos e procurar encontrar no pleito de cada uma das partes a essência do animus com que cada um participa da controvérsia.
A principal característica da conciliação consiste na hipótese de que se as partes não chegarem a um entendimento o conciliador pode propor uma solução, que a seu ver seja a mais adequada àquela situação. Ficando a vontade das partes a aceitação da solução proposta pelo conciliador. Por ser um processo pacífico e voluntário cria um ambiente adequado para que as partes procurem de forma criativa uma solução amigável para sua disputa. O conciliador tem como objectivo principal conduzir as partes, ou se for o caso propor a elas, a melhor solução para o problema.
A conciliação pode ser aplicada em qualquer tipo de conflito que surja na convivência entre as pessoas. É antes de tudo, assim como a mediação, uma técnica para solução dos conflitos de interesses que podem surgir em qualquer meio, seja ele político, comercial nacional ou internacional, entre empresas, entre pessoa física e pessoa jurídica e entre pessoas físicas.
Assim sendo, dentro de uma posição muito difícil de estar neutro, equidistante e imparcial, e sem que emita qualquer pré-julgamento, deverá o conciliador analisar a questão sob os aspectos técnicos, sopesar os pontos controversos e procurar encontrar no pleito de cada uma das partes a essência do animus com que cada um participa da controvérsia. A conciliação poderá ser conduzida directamente pelo juiz togado como pelo leigo ou pelo conciliador sob orientação deste. Tendo a conciliação sucesso, a mesma será reduzida termo e recebera homologação do juiz togado, mediante sentença a que se reconhece a força de título executivo.
Logo, se o juiz togado dirigiu a instrução caberá a ele proferir o julgamento de mérito da causa, pelo princípio da imediatidade e identidade física do juiz. Se for o juiz leigo quem dirigiu a instrução, caberá a ele proferir a sentença, a qual terá que ser imediatamente homologada pelo juiz togado. A sentença realmente só adquire a sua eficácia específica depois de passar pelo juiz togado, seja pela homologação, ou seja, pela elaboração própria.

5. CONCILIAÇÃO ARBITRAL

Há na Lei n9 9.307/96, a forma moder­na e pacífica de solução de controvérsias. Entretanto, nos seus procedimentos prevê as hipóteses de conciliação, como forma de extinção do processo. Assim, o § 4ºdo art. 21, dispõe que competirá ao árbitro ou ao tribunal arbitral, no início do procedimento, tentar a conciliação das partes, aplicando-se no que couber o disposto no art. 28. Vale dizer, na primeira audiência deverá haver uma tentativa de conciliação que, se concretizada, além do termo de conciliação, o árbitro ou tribunal lavrará uma sentença, para os efeitos previstos no art. 31, isto é; para valer como Título Executivo.
Além dessa hipótese, o art. 28 prevê, também, em qualquer fase processual, a conciliação, quando as partes chegarem a um acordo quanto ao litígio. Entre­tanto, isso dificilmente ocorrerá sem que haja a condução desse acordo pelo árbitro. Para tanto, deverá o árbitro conhecer métodos e processos necessários ao alcance dessa previsão legal.
Oportuno ressaltar que a sentença arbitral, após a conciliação, não obs­tante a desvinculação do procedimento judicial, deverá conter os requisitos obri­gatórios e previstos nos arts. 26 e 28 da Lei n9 9.307/96. Assim, a conciliação não ocor­rerá por acaso, demandando não só do conhecimento técnico e profundo da matéria em discussão, como também um trabalho de esclarecimentos técnicos dos fatos ou pontos de divergência, que permitam uma redefinição dos pleitos defendidos pelas partes, vez que o árbitro, como especialista na matéria, deverá trazer enfoques desconhecidos pelas partes que contribuirão para a referida redefinição do objecto da controvérsia e alavancarão uma possível conciliação.

6. ARBITRAGEM

A arbitragem, possui uma característica peculiar, que é a autonomia da vontade, como seu principal fundamento. Isto é o árbitro, deve ser escolhido pelas partes. Assim, a escolha das normas que servirão de base para o processo, o exame da matéria que as partes escolherão, será uma arbitragem de direito ou de equidade, fundamentada nos Princípios Gerais de Direito, ou ainda nas regras internacionais de comercio, e por ultimo, escolhendo o local onde se desenrolara o procedimento e ainda em que idioma os trabalhos serão executados.
Todas as questões que venham a ocorrer envolvendo Direitos patrimoniais disponíveis poderão eleger a arbitragem como procedimento para solucioná-los, isto dentro dos termos da Lei 9.307/96. Única forma de solução extrajudicial disciplinada pela legislação brasilei­ra, tendo como última norma a Lei n9 9.307/96, que veio resgatar do esquecimento centenário de nossas instituições a arbitragem, em face da burocracia da homologação que impedia o seu uso efectivo no âmbito de nosso país.
Com força de contrato autónomo, a “cláusula compromissória” é o mecanismo de implementação do procedimento arbitral na solução de controvérsias sobre direitos patrimoniais disponíveis (com liberdade para a escolha das regras para sua instituição e desenvolvimento, bem como as leis aplicáveis, entre as quais o uso da equidade).
Essas extraordinárias modificações da economia mundial, não poderia deixar incólume a “justiça” lato sensu, eis que desafios, eis como afixação de foro competente para resolver interesses transnacionais ou internacionais, necessitam ser resolvidos. Ora, tudo nos leva a concluir que a arbitragem é a única alternativa viável para a solução dos litígios patrimoniais privados, para compor conflitos entre particulares de duas ou mais nações. Criar uma jurisdição fixa, estruturada pelos países interessados, é uma opção bastante dispendiosa e distanciada de uma comunidade que se mantém coesa por força de interesses e convicções económicas comuns, e não por um ordenamento jurídico estatal multinacional.
No aspecto da amplitude, liberdade, economia, simplicidade, agilidade, confidencialidade já exaustivamente abordados em outros módulos, não restam dúvidas de que, no mundo moderno, particularmente no mundo económico onde “tempo economizado é dinheiro poupado”, a arbitragem concede às partes tama­nha amplitude no poder de agir que poderá gerar, até mesmo, situações baseadas simplesmente no método “por equidade”, não se lhe aplicando nenhuma lei ou norma adjectiva ou substantiva ao caso, julgando o árbitro ex aequo et bono.
Os procedimentos adoptados para a prolação da decisão final são os determinados pelas partes, impondo, assim, um modelo muito menos formal para a solução da controvérsia. Os árbitros poderão ser juristas ou não, devendo ter o domínio do conhecimento dos assuntos sobre os quais se impõe a solução como factor determinante da sua escolha, baseada na confiança que é nutrida sobre seu desempenho, mor­mente já demonstrado em casos análogos antecedentes. A decisão arbitral, definitiva e obrigatória por natureza, pode ser de forma constitutiva ou declaratória (consultiva), sendo, na primeira hipótese, um título executivo judicial.
Pela arbitragem privada, as partes resolvem submeter suas lides resultantes de determinadas relações jurídicas de direito privado a um tribunal arbitral, composto por um árbitro único ou uma maioria deles, designados, em princípio, elas partes ou por uma entidade por elas indicada. Mediante a instituição do tribunal arbitral, exclui-se a competência dos juízes estatais para julgar a mesma lide.
Incidentalmente, nos juizados de pequenas causas, pode ser escolhida a arbitragem como forma de solução do litígio (lei 9.099/95, arts. 24 a 26), de modo que, alguns casos, a lei parece indicar ou induzir o interessado a procurar outras formas de solução dos litígios, deixando a justiça tradicional para o último caso.
A arbitragem tem especial importância no direito privado internacional, nas relações comerciais, cada vez mais numerosas em função da globalização dos mercados. Por exemplo, por meio da arbitragem os processos são normalmente sigilosos, ao passo que no Judiciário a regra é a publicidade, que em certos casos é muito prejudicial. Os juízes de carreira normalmente não estão preparados para resolver as pendências internacionais, que costumam ser complexas dos pontos de vista técnico e jurídico, ao passo que o árbitro pode ser escolhido entre pessoas que tenham essa capacitação especial.
No que diz respeito às regras jurídicas, podem ter especial importância os princípios gerais de direito, os usos e costumes e as regras internacionais de comércio. Há duas formas de ser convencionada a arbitragem: a cláusula compromissória e a convenção de arbitragem. A cláusula compromissória. Ela é feita de forma contratual e preventiva, pois os interessados assim dispõem antes de terem entre si um litígio qualquer, devendo ser sempre feita por escrito, no corpo do próprio contrato ou não, mas nos casos de contrato de adesão é preciso que ela tenha um destaque especial para ter validade.
A cláusula arbitral é tão autónoma em relação ao negócio principal que pode até mesmo ser estipulada em documento separado. O tribunal arbitral decidirá a respeito da validade do contrato. O árbitro não precisa ter formação jurídica, mas ser capaz de entender o problema e dar-lhe uma solução, um julgamento, além de ter a confiança das partes. Nas causas tecnicamente mais complexas, espera-se que o árbitro tenha um conhecimento especial do assunto, mas nada impede que ele se valha de um perito, como qualquer juiz de direito faria.
É natural que ao árbitro se apliquem as regras de impedimento e suspeição porque na realidade é ele um juiz de fato e de direito, até mesmo com poderes mais amplos porque o seu julgamento não fica sujeito a recurso ou homologação do Poder Judiciário, sendo natural que ele seja equiparado a um funcionário público, para efeitos penais. Assim que o árbitro aceitar a nomeação considera-se instituída a arbitragem e quem tiver qualquer dúvida ou reclamação deverá manifestar-se na primeira oportunidade, como determina o princípio da boa fé. A sentença arbitral não depende de homologação da justiça estatal, mas deve obedecer a certos requisitos formais, como por exemplo ser feita por escrito, devidamente assinada, podendo haver voto vencido. A sentença deve ter relatório, fundamentação e dispositivo, tal qual a sentença estatal, mas não há apelação para sua revisão. Não há apelação, mas pode-se requerer algo semelhante aos embargos de declaração, no prazo de 5 dias contados da notificação do julgamento.
As partes podem estipular o prazo em que a sentença será proferida, mas a omissão a respeito faz com que ele seja de 6 meses com a possibilidade de ser prorrogado. Além de não precisar de homologação estatal, a sentença arbitral tem o mesmo efeito jurídico de uma sentença judicial, numa autêntica "privatização da justiça", tendo inclusive eficácia executiva quando condenatória.
Além dos "embargos declaratórios", contra a sentença arbitral só cabe acção judicial para sua anulação, no prazo de 90 dias, desde que presente alguma das situações do art. 32, de forma semelhante à acção rescisória. Porém, decorrido o prazo para a anulação da sentença arbitral, a sua nulidade ainda pode ser alegada em embargos à execução, que deve ser sempre judicial.
Como toda sentença estrangeira, a arbitral depende de prévia homologação do STJ para produzir efeitos no Brasil, sendo poucas as hipóteses em que a homologação não será concedida.
O procedimento da arbitragem é sigiloso, não vigorando o princípio processual da publicidade, tanto que o árbitro tem que agir com discrição. Se o julgado arbitral não for cumprido espontaneamente, deverá ser executado, o que se dará perante a justiça estatal, como já ocorre com os julgados do próprio Poder Judiciário.
Com essas cautelas teremos na arbitragem uma outra opção de justiça, escolhida pela vontade das partes, ficando afastada a injusta dicotomia temida por alguns inimigos da arbitragem, que é a transformação desta numa justiça eficaz e privada para os ricos, coexistindo com uma justiça estatal e ineficiente para os pobres, à semelhança do que ocorre hoje na área da saúde.


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SOUZA, Paulo Roberto Pereira de. Harmonização de Leis Ambientais nos Dez Anos do Mercosul, artigo, Mundo Jurídico.
Curso de Mediação e Arbitragem módulo I Mediação, Programa de Fortalecimento da Arbitragem e da Mediação Comercial no Brasil Curso feito pelo SEBRAE.
Curso de Mediação e Arbitragem módulo II Arbitragem, Programa de Fortalecimento da Arbitragem e da Mediação Comercial no Brasil Curso feito pelo SEBRAE.
[1] CACHAPUZ, Rozane da Rosa, Mediação nos Conflitos & Direito de Família, 1 ed. \Jurua, 2003, p.11
[2] Cachapuz, Rozane da Rosa, Mediação nos Conflitos & Direito de Família, 1ª ed., \jurua, 2003, pág.24.

Ferreira Celso

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